Hoje fui acordada por minha jovem
filha, seus olhos irradiavam energia e vitalidade. Havia uma ensolarada manhã a
descortinar. Minha cabeça doía... Não bebi, não festei, não fumei, nem estava
com enxaqueca... Perdi o juízo, como diria minha avó... tirei um siso, ainda
sofria os efeitos, mas mais adiante me beneficiaria com a extração...
diminuiria os efeitos de um bruxismo.
Coisas modernas.
Tive sonhos excêntricos durante a
noite.
Acho que nem Freud os
interpretaria, ou talvez sim, talvez se ele fosse meu psicanalista, me diria:
“-Você precisa transar, sexo te deixaria cansada e você não sonharia.” – Sábio
Freud.
Não estou fugindo do tema, qual
relação haveria entre meus sonhos e o Pântano?
“Uma grande ideia.”
Não costumamos sonhar com grandes
ideias, nem acontecem mais “grandes ideias” hoje em dia. Nem utopias as quais
lutar, nem mitologias as quais acreditar.
Já passei do tempo de ficar
buscando sentido ao olhar para o passado, mas ele me ajuda. Óh, Deus sabe como!
Como me ajuda nas minhas mais loucas interpretações. Outras interpretações são
inspiradas especialmente por Clifford Geertz e a Interpretação das Culturas,
entre tantas contribuições.
Venho contar dessa vez de um
lugar inusitado, cercado de vegetação gramínea, aquosidade e répteis (os quais
quero distância), tenho verdadeiro horror a sapos e afins. O Pântano Le Grande
Idée é de uma biodiversidade fantástica, há também agrupamentos e mutações de
espécies, como os que vemos com os políticos que vivem mudando de partido;
embora esse lugar, tenha sido chamado assim, acredita-se que há muita
semelhança com a demanda política de nosso país, em que o sonho de muitos
mortais, e não o meu, meus sonhos são mais simples e malucos como os de Alice e
o País das Maravilhas, mas há quem sonhe ser um representante na rentável e
nada confiável máquina pública.
Estamos prestes a eleger mais um
representante presidenciável e eu vou contribuir com mais uma eleição. Não
somente por me sentir uma cidadã atuante, mas também por “ganhar” seis dias de
“folga” por tamanha contribuição. Sou solidária. O prêmio é a consequência,
embora tenha sido considerada na colaboração; seria também a causa? Bem, eu
moro no Pântano, vivo sob suas normas, seus valores, sua cultura, seus ritos,
suas cavernas.
Geertz escreveu a introdução de
seu livro em 73, um ano antes de eu nascer. O cara já sacava tudo, tudo mesmo.
Será que usou LSD, e aqueles baratos loucos dos anos 70? Perdão, segui o curso
das borbulhas de um moscatel barato. ..
(coisas que Marx não previu, e por mais incrível que pareça não estava
aqui para ver essa reinvenção capitalista do comunismo, a globalização e o
consumismo). Estou chegando aos 40, sou brasileira, mulher e sei o que é um
moscatel, coisas não muito comuns às mulheres naquela época.
Bem, a semelhança entre o que
Geertz trazia à tona naquela época sob seu olhar antropológico e o Pântano em
que vivo, é algo que me leva imaginativamente aos rituais balineses que ele
descrevia, aos círculos dos rituais em que as tribos se encontravam e as
reações psicossomáticas que manifestavam. Não se tratava apenas de uma
canalização de energias para conectar espíritos, mas acima de tudo da
incorporação de uma cultura, de um estilo de pensamento que se transforma em
ação.
Tenho medo, tenho sonhos.
Temo
perceber que a vivacidade de minha filha numa bela manhã de sábado seja ligada
apenas ao fato de que há liquidação na fábrica de uma marca conhecida na moda
local. Temo não acreditar mais em nenhuma perspectiva política, e que a
alternância de poder se torne tão banalizada quanto os Deuses pagãos do Olimpo;
ou em contradição sejamos a parte esquecida da Terra chata e redonda que os
gregos acreditavam existir.
Esse é um escrito sem poesia, talvez
queira fugir à hipocrisia. Minha filha chega, me tirando desses devaneios
translúcidos, pra se arrumar para sair. E ela acaba de dizer: - Ei eu sou tua
filha...
É sua segunda eleição (que ela vota), vivemos
no Pântano... ela ainda tem vitalidade, e nós? Falta-nos uma grande, boa e
criativa ideia.